Sete Alegrias

"Alegra-Te, Cheia de Graça…"

Arquivos Mensais: dezembro 2013

Dispostos a tudo

O aluno recusou-se a pagar o que devia ao professor. Má hora. Porque o Caloteiro não era aluno de um curso qualquer, era aluno de karatê, e o sensei, acostumado a se desviar de soco na cara e aparar chute nos países baixos, não ia se deixar abater por uma simples rasteira.

O valor não era pequeno, e o professor não teve dúvidas: reuniu 60 karatecas e foi jantar na churrascaria do Aluno Caloteiro, empresário do ramo grastronômico. Meu amigo Zé, especialista em confusão, era um dos alegres convivas.

Finda a farta refeição, o Caloteiro apresentou a conta ao sensei, uma gorda conta, pois os famintos e insaciáveis praticantes tinham fome de leão já que precisavam repor a energia de quem passa horas dando chutes verticais.

– Mas, o que é isso? perguntou o surpreso sensei. Conta? Que conta, se eu não devo nada? Não estou entendendo…

Enfurecido, o Aluno-Empresário-Caloteiro vociferou:

– Ou paga ou eu chamo a polícia.

– Pode chamar. Mas, antes da polícia chegar, o prejuízo vai ser grande. Eis que estou com 60 karatecas, 60 homens dispostos a tudo. Quando a polícia chegar, vai ter mesa espetada no teto. E, na volta da delegacia, vamos atalhar por aqui…

O apatetado Caloteiro olhou ao redor e não gostou do que viu. Sessenta trogloditas em ponto de bala, molas prestes a pular, esperando feito gatos, prontos para entrar em combate à menor ordem do chefe. Polícia? Talvez um batalhão da tropa de choque para dar conta dos alentados artistas marciais! O Caloteiro achou mais barato, ou mais prudente, deixar pra lá.

Esta singela e construtiva história me faz desejar – a mim e a você, cara leitora, caro leitor –, esta mesma energia para buscarmos a realização de todos os nossos sonhos no novo ano que se avizinha.

E desejar que, pelo nosso ideal de vida, estejamos também dispostos a tudo.

Feliz Ano Novo!

***

Livros de 2013

O livro caindo n’alma,
é germe que faz a palma,
É chuva que faz o mar.
– Castro Alves

*

O ano começou bem, muito bem, com o lançamento de Maquiavel Pedagogo – ou o ministério da reforma psicológica –, de Pascal Bernardin, obra que chegou com atraso de 18 anos, mas antes tarde do que nunca. O livro mostra como as mais perversas técnicas de manipulação psicológica, usadas no sistema educacional, na mídia de massa, na gestão de empresas e no controle social, estão nos conduzindo a uma sociedade totalitária. Leia urgentemente este livro para saber como estão enganando você.

No cenário internacional, o velho general Ion Mihai Pacepa, do alto dos seus 85 anos de vida e do seu posto avançado e bem camuflado, continua mandando bala. Lançou em junho Disinformation: Former Spy Chief Reveals Secret Strategies for Undermining Freedom, Attacking Religion and Promoting Terrorism, escrito em coautoria com o professor Ronald J. Rychlak. O comunismo não morreu, não, está se fazendo de morto para assaltar o coveiro.

E, por falar em combate, a editora Molokai, veio para a luta. Iniciativa do professor de karatê José Alberto de Siqueira Campos, chegou para ajudar a preencher a lacuna de décadas de atraso no mercado editorial brasileiro. Pertence à Molokai a famosa “Terapia das Doenças Espirituais” do Padre Paulo Ricardo, outro faixa-preta na guerra cultural.

Em meio às polêmicas sobre as biografias, o incansável Lira Neto lançou o segundo volume da trilogia sobre Getúlio Vargas, edição com elogios dos ex-presidentes FHC e Lula estampados na quarta capa. Isso já mostra o peso da obra. Goste ou não do trio, não deixe de ler este livro porque, como diz o History Channel, você precisa saber onde está. Aproveite para comprar logo o seu exemplar antes que seja proibido pelo fantasma de Getúlio – não estou brincando não, já há precedentes na ressurreição de presidentes da república são-borjenses.

E, falando em presidentes, compre também o Assassinato de Reputações – Um Crime de Estado, de Romeu Tuma Júnior. O livro mostra os meandros do estado policial petista e, de quebra, diz que Lula (apelidado de “Barba”) foi um informante (“ganso” no jorgão policial) da ditadura. Serão ambos convocados pela Comissão da Meia Verdade?

O melhor de 2013, entretanto, foi o novo arrasa-casamatas de Olavo de Carvalho, organizado por Felipe Moura Brasil: O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota. Ou O mínimo que você precisa saber para não ser feito de trouxa. Ou Manual anti-loucura. A frase inicial é emblemática: “Se você não é capaz de tirar de um livro consequências válidas para a sua orientação moral no mundo, você não está pronto para ler este livro”. Parafraseando Bruno Tolentino, pelo simples fato de poder ler Olavo no original, já vale a pena ter nascido brasileiro.

No Ano Novo, desejo a você, cara leitora, caro leitor, um feliz livro novo!

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O Nascimento do Terrorismo

“Como me disse o chefe da KGB, Yury Andropov, um bilhão de inimigos podia infligir um dano maior aos Estados Unidos do que apenas alguns milhões. Precisávamos instilar um ódio estilo nazista contra os judeus em todo o mundo islâmico, e fazer esta arma emocional gerar um banho de sangue terrorista contra Israel e o seu principal parceiro, os Estados Unidos.”

Este artigo foi publicado no National Review em 24 de agosto de 2006. O autor, Ion Mihai Pacepa, é o oficial de mais alta patente que desertou do bloco comunista.

Pegadas Russas

O que Moscou tem a ver com a recente guerra no Líbano?

O principal vencedor na guerra do Líbano talvez seja o Kremlin. Israel tem sido atacado com Kalashinikovs e Katyushas russos, foguetes Fajr-1 e Fajr-3 russos, mísseis antitanques AT-5 Spandrel russos e foguetes antitanques Kornet russos. As obsoletas armas russas são o objeto de desejo de terroristas em todo o mundo, e os bad guys sabem exatamente onde obtê-las. Nas caixas das armas abandonadas pelo Hezbollah estava escrito: “Cliente: Ministério da Defesa da Síria. Fornecedor: KBP, Tula, Rússia”.

O terrorismo internacional atual foi concebido em Lubyanka, quartel general da KGB, no rastro da Guerra de Seis Dias, de 1967, no Oriente Médio. Eu testemunhei o seu nascimento na minha outra vida, como general comunista. Israel humilhou Egito e Síria, cujos belicosos governos eram dirigidos por conselheiros soviéticos da razvedka (“inteligência externa” em russo), e, a partir daí, o Kremlin decidiu armar os vizinhos inimigos de Israel, os palestinos, e persuadi-los a entrar numa guerra de terrrorismo contra aquele país.

O general Aleksandr Sakharovsky, criador da estrutura de inteligência da Romênia comunista, depois elevado a chefe de toda a inteligência externa da Rússia soviética, uma vez me instruiu: “No mundo atual, as armas nucleares tornaram obsoleta a força militar, e por isso o terrorismo deve se tornar a nossa principal arma”.

Entre 1968 e 1978, ano em que rompi com o comunismo, as forças de segurança da Romênia, sozinhas, haviam enviado semanalmente dois aviões de carga repletos de bens militares para os terroristas palestinos no Líbano. Desde a queda do comunismo, os arquivos da alemã-oriental Stasi revelaram que, só em 1983, o seu serviço de inteligência externo remeteu o correspondente a US$ 1.877.600 em munição de AK-47 para o Líbano. De acordo com Vaclav Havel, a Techoslováquia comunista entregou mil toneladas do explosivo inodoro Semtex-H (indetectáveis por cães farejadores) para terroristas islâmicos – o suficiente para 150 anos de ação.

A guerra terrorista foi iniciada no fim de 1968, quando a KGB transformou o sequestro de aviões – a arma escolhida para o 11 de setembro – em instrumento de terror. Apenas em 1969, houve 82 sequestros ao redor do mundo, feitos pela OLP financiada pela KGB. Em 1971, quando eu estava visitando Sakharovsky no seu escritório em Lubyanka, ele chamou a minha atenção para um mar de bandeiras vermelhas fincadas num mapa mundi pendurado na parede. Cada bandeira representava um avião capturado. “O sequestro de aviões foi invenção minha”, declarou.

O “sucesso” político decorrente do sequestro de aviões israelenses impeliu o 13° Departamento da KGB, conhecido no nosso jargão de inteligência como “Department for Wet Affairs” (wet era um eufemismo para sangrento), a partir para a realização de “execuções públicas” de judeus em aeroportos, estações de trem e outros lugares públicos. Em 1969, o dr. George Habash, marionete russa, explicou: “Matar um judeu longe do campo de batalha é melhor do que matar cem judeus no campo de batalha, pois atrai mais atenção”.

No fim dos anos 1960, a KGB estava profundamente envolvida em terrorismo em massa contra judeus, levado a cabo por diversas organizações palestinas. Eis algumas ações terroristas pelas quais a KGB levou o crédito enquanto eu ainda estava na Romênia: novembro de 1969: ataque armado contra o escritório El Al em Atenas, com 1 morto e 14 feridos; 30 de maio de 1972: ataque no Aeroporto Ben Gurion, com 22 mortos e 76 feridos; dezembro de 1974: atentado a bomba no cinema de Tel Aviv, com 2 mortos e 66 feridos; março de 1975: ataque a um hotel em Tel Aviv, com 25 mortos e 6 feridos; maio de 1975: atentado a bomba em Jerusalém, com 1 morto e 3 feridos; 4 de julho de 1975: atentado a bomba no Zion Square, Jerusalém, com 15 mortos e 62 feridos; abril de 1978, ataque ao aeroporto de Bruxelas, com 12 feridos; maio de 1978, ataque no avião El Al em Paris, com 12 feridos.

Em 1971, a KGB lançou a operação Tayfun (tufão, em russo), destinada a desestabilizar a Europa Ocidental. O Baader-Meinhof, a Red Army Faction (RAF) e outras organizações financiadas pela KGB lançaram uma onda de terrorismo anti-americano que chocou a Europa Ocidental. Richard Welsh, o chefe do posto da CIA em Atenas, foi morto a tiros na Grécia em 23 de dezembro de 1975. O general Alexander Haig, comandante da OTAN em Bruxelas, foi ferido num atentado a bomba que estraçalhou o seu Mercedes blindado em junho de 1979. O general Frederick J. Kroesen, comandante das forças americanas na Europa, escapou da morte por pouco em um ataque a foguete em setembro de 1981. Alfred Herrhausen, o presidente pró-americano do Deutsche Bank, foi morto durante um ataque a granada em novembro de 1989. Hans Neusel, secretário de estado pró-americano do ministério do interior da Alemanha Ocidental foi ferido durante uma tentativa de assassinato em julho de 1990.

Em 1972, o Krenlim decidiu jogar todo o mundo islâmico contra Israel e contra os EUA. Como me disse o chefe da KGB, Yury Andropov, um bilhão de inimigos podia infligir um dano maior aos Estados Unidos do que apenas alguns milhões. Precisávamos instilar um ódio estilo nazista contra os judeus em todo o mundo islâmico, e fazer esta arma emocional gerar um banho de sangue terrorista contra Israel e o seu principal parceiro, os Estados Unidos. Ninguém dentro da esfera de influência americana/sionista podia mais se sentir seguro.

De acordo com Andropov, o mundo islâmico era uma placa de Petri esperando ser cultivada, na qual poderíamos criar uma virulenta cultura de ódio anti-americano a partir da bactéria do pensamento marxista-lenista. O anti-semitismo islâmico lançou raízes profundas. Os muçulmanos têm uma queda pelo nacionalismo, pelo jacobinismo e pela vitimologia. As suas iletradas e oprimidas multidões podiam ser insufladas até um estado de agitação extrema.

O terrorismo e a violência contra Israel e o seu amo, o sionismo americano, fluiria naturalmente a partir do fervor religioso muçulmano, apregoou Andropov. Bastava apenas continuar repetindo os nossos lemas – os Estados Unidos e Israel eram “países fascistas e imperalistas-sionistas” financiados pelos judeus ricos. O Islã estava obcecado em evitar a ocupação do seu território pelos infiéis, e seria altamente receptivo à nossa caracterização do Congresso dos Estados Unidos como uma voraz instituição sionista desejosa de converter o mundo todo em um feudo judeu.

O codinome desta operação foi “SIG” (Sionistskiye Gosudarstva, ou “Governos Sionistas”), e estava dentro da “esfera de influência” do meu serviço romeno, pois englobava a Líbia, o Líbano e a Síria. SIG era uma operação envolvendo muitos países e parceiros. Criamos joint ventures para construir hospitais, casas e estradas nestes países, e para lá enviamos milhares de médicos, engenheiros, técnicos, professores e até instrutores de dança. Todos tinham como tarefa retratar os Estados Unidos como um feudo judeu arrogante e orgulhoso financiado pelo dinheiro judeu e governado por políticos judeus, cujo objetivo era subjugar o todo mundo islâmico.

Em meados dos anos 1970, a KGB ordenou ao meu serviço, o DIE – juntamente com outros serviços irmãos da Europa Oriental – que percorresse o país procurando confiáveis ativistas, parceiros pertencentes aos vários grupos étnicos islâmicos, para que fossem treinados em operações de desinformação e terrorismo e infiltrados nos países da nossa “esfera de influência”. A sua tarefa seria exportar um ódio radical e insensato contra o sionismo americano manipulando a ancestral aversão aos judeus sentida pelo povo naquela parte do mundo. Antes que eu deixasse a Romênia para sempre, em 1978, o meu DIE havia despachado cerca de 500 destes agentes disfarçados para os países islâmicos. De acordo com uma estimativa grosseira recebida de Moscou,  até 1978 o serviço de inteligência do bloco soviético, como um todo, havia enviado cerca de 4 mil destes agentes de influência para o mundo islâmico.

Em meados da década de 1970, também começamos a despejar no mundo islâmico uma tradução árabe dos Protocolos dos Sábios de Sião, uma falsificação da Rússia czarista que havia sido usada por Hitler como fundamento para a sua filosofia anti-semita. Também disseminamos um “documento” fabricado pela KGB em árabe, segundo o qual Israel e o seu principal apoiador, os Estados Unidos, eram países sionistas dedicados a converter todo o mundo islâmico em uma colônia judaica.

Nós, do bloco soviético, tentamos conquistar mentes, pois sabíamos que não podíamos vencer as batalhas militares. É difícil dizer quais são exatamente os efeitos remanescentes da operação SIG. Mas o efeito cumulativo da disseminação de centenas de milhares de Protocolos no mundo islâmico e da retratação de Israel e Estados Unidos como inimigos mortais do Islã certamente não foi construtivo.

A Rússia pós-soviética foi transformada de maneira sem precedentes, mas a crença amplamente popular de que o nefasto legado soviético foi cortado pela raiz com o fim da Guerra Fria, como o nazismo foi eliminado no fim da Segunda Guerra Mundial, não é correta.

Na década de 1950, quando eu era o chefe do posto de inteligência externa romeno na Alemanha Oriental, testemunhei como o Terceiro Reich de Hitler foi demolido, os seus criminosos de guerra levados a julgamento, as suas forças militares e policiais desmanteladas e os nazistas varridos da vida pública. Nada disso aconteceu com a antiga União Soviética. Nenhuma pessoa foi julgada, apesar do regime comunista soviético ter matado mais de cem milhões de pessoas. A maior parte das instituições soviéticas foram deixadas em paz, simplesmente trocaram de nome, e agora muitas são dirigidas pelas mesmas pessoas que governaram o estado comunista. No ano 2000, os antigos oficiais da KGB e do Exército Vermelho soviético assumiram o controle do Kremlin e do governo da Rússia.

A Alemanha jamais teria se tornado uma democracia com os oficiais da Gestado e da SS no comando.

No dia 11 de setembro de 2001, o presidente Vladimir Putin foi o primeiro líder de um país estrangeiro a expressar condolências ao presidente George W. Bush pelo que chamou de “terríveis tragédias dos ataques terroristas”. Logo em seguida, entretanto, Putin começou a mover o seu país de volta para os negócios com terroristas. Em março de 2002, ele discretamente retomou as vendas de armas para o ditador terrorista do Irã, aiatolá Khamenei, e envolveu a Rússia na construção de um reator nuclear de mil megawatts em Bushehr, incluindo uma instalação de conversão de urânio capaz de produzir material físsil para armas nucleares. Centenas de técnicos russos também começaram a ajudar o governo do Irã a desenvolver o míssil Shahab-4, com alcance superior a 2 mil quilômetros e capacidade para transportar uma ogiva nuclear ou armas químicas a qualquer ponto do Oriente Médio e da Europa.

O presidente atual do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, já anunciou que nada poderá impedir o seu país de construir armas nucleares, e chamou Israel de “vergonhosa mancha no mundo islâmico”, que devia ser eliminada. Durante a Segunda Guerra Mundial, 405.399 americanos morreram para erradicar o nazismo e o terrorismo anti-semita. Agora, estamos enfrentando o facismo islâmico e o terrorismo nuclear anti-semita. As Nações Unidas não podem oferecer nenhuma esperança. Até hoje não foram capazes sequer de definir a palavra “terrorismo”.

Segundo um ditado, um tiro leva a outro. O Kremlin pode ser a nossa melhor esperança. Em maio de 2002, os ministros da OTAN aprovaram uma parceria com a Rússia, antigo inimiga da aliança. O mundo inteiro disse que a Guerra Fria estava encerrada. Kaput. Agora, a Rússia quer ser admitida na Organização Mundial do Comércio. Para isto acontecer, o Kremlin deve ser firmemente advertido para, antes, abandonar o terrorismo.

Também devemos ajudar os russos a perceber que é do seu máximo interesse desestimular o presidente Ahmadinejad a obter armas nucleares. Ele é um tirano imprevisível que, de um momento para o outro, pode considerar a Rússia também um inimigo. “Se o Irã conseguir armas de destruição em massa, transportáveis por mísseis, vai se tornar um problema” declarou corretamente o presidente Bush. “Vai se tornar um problema para todos, inclusive para a Rússia”.

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Procuram o Menino para Matar

José adormeceu sorrindo, pensando nos alegres e recentes acontecimentos: o nascimento do Bebê Jesus, a alegria da sua esposa, a homenagem dos reis magos, o coro dos anjos. Toda a criação rendia glória ao seu filho, até o boi e o burro, até a natureza inanimada, até a estrela do oriente.

Mas, no meio da noite, surgiu a mensagem terrível e urgente trazida pelo anjo:

– Pega o Menino e Sua Mãe e foge! Herodes vai procurar o Menino para matá-Lo!

A reação de José, como sempre, foi de paz e obediência.

Este espisódio, à luz do nosso mundo, do mundo moderno, caracterizado pela rebeldia, parece ainda mais insólito. O homem de hoje, no lugar de José, certamente diria “um momento, não é este o Filho de Deus, o Verbo Incarnado, como assim, fugir? Pelo contrário, vamos já providenciar um bom esquadrão de anjos vingadores e dar uma lição nesse Herodes”.

Este é o pensamento da sociedade atual, da qual fazemos parte, e não é verdade que muitas vezes pensamos assim frente às contrariedades? Não queremos dar ordens a Deus e ditar a ordem dos acontecimentos? Já paramos para analisar a má influência da mídia de massa, do sistema educacional e da indústria cultural – instituições maciçamente dirigidas por inimigos de Deus – na nossa formação? Já avaliamos quantas rebeldias foram plantadas dentro de nós por estes inimigos da fé? Já sentimos dentro de nós o orgulho, a inveja, o despeito, todos estes vapores borbulhando, prestes a explodir frente à menor contrariedade, um incidente no trânsito, um comentário no seio familiar?

José sabia que a sua vida era uma missão, empreitada de amor concebida por Deus, e, tanto quanto ele, todos nós – eu e você – temos uma missão, única, exclusiva, irrepetível e intransferível.

“Ah, mas a tarefa de José era diferente, era cuidar do Filho de Deus, e a minha vida é insignificante…”

Este é mais uma das armadilhas da vida moderna – a arapuca do brilho, da vanglória, da ostentação –, uma bomba-relógio colocada na sua cabeça para explodir quando você se estiver em uma encruzilhada, decidindo entre o bem e o mal. Que sábio pode saber o valor de uma vida? Se for realmente sábio, terá esta pretensão?

Pela sua obediência, José mereceu o mais alto dos céus, ao lado da sua esposa muito amada, a Virgem Maria, a Mãe de Deus. Quem diz isso não sou eu, não. São palavras emanadas da boca de Nosso Senhor Jesus Cristo:

– O que Deus uniu, o homem não separe!

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A Casa Grande de Haddad

O prefeito Fernando Haddad lançou a proposta do IPTU progressivo, nome bonito para um projeto cuja intenção é tirar mais dinheiro da gente. A FIESP entrou com uma ação no Judiciário e conseguiu barrar a insanidade.

Inconformado, Haddad disse que Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias, representa a Casa Grande, o senhor de escravos, desejoso de manter os seus privilégios em detrimento da penosa situação do povo habitante da senzala.

A réplica de Skaf foi sensacional:

– Realmente, como o IPTU progressivo atingiria quase toda a população, seria preciso uma casa muito grande para abrigar todos os prejudicados.

Bom humor à parte, o episódio não tem nada de divertido para nós, escravos pagadores de impostos, brasileiros de um país socialista, praticante da velha tática leninista de subjugar o povo por meio de impostos, cuja carga tributária ultrapassa 60% segundo cálculos de Ives Gandra, cuja elevação dos juros em 2013 só perde para o aumento ocorrido na Gâmbia. É a sociedade dual: governantes e governados, elite e massa, senhores e escravos.

Contra a sanha arrecadatória, ponta-de-lança do sistema socialista, só há uma saída, ensinada por Ion Mihai Pacepa: a luta pela mente dos homens, a guerra cultural, a substituição do sentimento infantil do brasileiro – que busca na tutela do Estado a proteção para a sua inépcia – pela livre iniciativa, pela autonomia e pela maturidade.

Afinal de contas, quem você acha que cuida melhor do seu dinheiro?

Você ou o prefeito?

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Feliz Natal!

Desejo, a todas as minhas leitoras e a todos os meus leitores, um feliz Natal!

E agradeço pela atenção que têm me dado, muito obrigado!

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Aos homens de boa vontade

No princípio, Deus criou o céu e a terra. Criou porque é Amor, e o Amor é criador. Fez um jardim de delícias e nele colocou homem e mulher. Mas as criaturas renegaram o Amor e foram expulsas do paraíso quando o pecado se instalou em seus corações. Danou-se!, como dizem os baianos. Na Sua infinita misericórdia, Deus se compadeceu e deu uma segunda chance ao homem, enviando o Seu Filho Único para redimir o pecado.

Na noite de Natal, Maria, calada, tudo observa e tudo conserva em seu coração. A Virgem pariu sem dor, o Bebê não chora, sorri. José, silencioso, também nada fala.  Os reis magos, na cena da manjedoura, também se calam. Até o boi e o burro ficam quietinhos. Tudo é envolvido em profundo silêncio, como que para realçar a mensagem dos pastores transmitindo o louvor da milícia celeste: Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade.

Glória a Deus nas alturas restabelece a verdade, o lugar do homem na criação, o sentido da vida, o sentido de cada uma das nossas vidas, da minha e da sua, o norte da nossa existência, a busca diária e diuturna pelo paraíso perdido.

Paz na terra aos homens de boa vontade. Um ditado diz “o inferno está cheio de boas intenções”. Muito pelo contrário, não há nenhuma boa intenção no inferno, apenas o ódio dos anjos caídos e a dor das almas condenadas e a indiferença delas entre si. As pessoas desejosas de paz no coração só têm um caminho, a retidão de intenção na busca da glória de Deus. O resto – o sonho dourado da comodidade, do bolso cheio, da barriga mais cheia ainda, dos aplausos, da conveniência – é moeda falsa. Cristo sempre realçou a intenção das pessoas. Em muitas ocasiões, disse: A tua fé te salvou. No episódio da pobre esmola da viúva, enalteceu: ela deu mais do que todos os outros. Seja no agir, no contemplar ou  no sofrer, o querer faz toda a diferença. Cristo nos deu o exemplo: agia pelo Pai, contemplava os lírios do campo como reflexo do Pai, e, na cruz, sofria por obediência ao Pai.

Particularmente de nós, brasileiros de uma época e sociedade esquecidas de Cristo, onde a malícia pode ser sentida em cada mentira amparada pelas mais perversas criações da segurança do homem no mundo, ditadas por satanás, o sacrifício exigido por Cristo é mantermos a boa vontade, a pureza de intenções em meio a demônios, não há outra saída, o cristianismo não dá soluções fáceis.

Toda esta história, crida por nós, cristãos – mais ainda, da qual somos participantes! – é uma história fantástica e absurda, tão fantástica e absurda que não pode ter sido concebida por mentes humanas, é uma história de santos e milagres, e o homem, ou os homens, que a inventassem precisariam ser santos para elaborá-la. E, se santos fôssem, não inventariam nada, não mentiriam.

Só nos resta meditar no imerecido dom da fé num Deus que se humilhou a ponto de nascer numa manjedoura porque não havia outro lugar para Ele. Da sua pobre acomodação, num mundo envolto em silêncio, o Bebê Jesus sorri.

Sorri para transmitir a Sua alegria, para que a Sua alegria esteja em nós, e a nossa alegria seja completa.

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No Trono do Amon Hen

Com O Anel no dedo, Frodo corria colina acima, deixando para trás Boromir e o seu cego desejo de se apoderar da jóia. Como o Pomo da Discórida, O Anel lançara a intriga, a inveja e a ambição no seio da Confraria dos Nove. Cansado, chegou ao topo do Amon Hen e sentou-se no Trono da Visão, na Colina do Olho dos homens de Númenor. Viu muitas imagens e, por todos os lados, sinais de guerra, orcs saindo de mil tocas, lutas entre elfos e homens e animais cruéis, cavaleiros galopando em Rohan, navios de guerra saindo dos portos de Harad; todo o poder de Senhor do Escuro estava em ação. O seu olhar foi atraído para o leste, contra a sua vontade, passando por pontes arruinadas e portões escancarados, chegando até o vale do terror em Mordor e então ele viu a temida Barad-dûr, a fortaleza de Sauron, e de repente, sentiu a presença do Olho que nunca dormia. Frodo sabia que ele tinha percebido o seu olhar. O Olho saltou, ávido e ferroz, à procura dele, e vinha, inexoravelmente, avançando reino por reino, amurada sobre amurada, logo saberia exatamente onde ele estava. Ouviu a si mesmo dizendo “Nunca, nunca!” ou seria “Sim, irei até você”?

Entretanto, como um relâmpago, outro pensamento veio-lhe à mente: “Tire-o! Tire-o! Tire O Anel!” As duas forças, o mal e o bem, lutavam dentro dele.

*

Vinha chegando o Natal, e duas forças lutavam dentro de José. O seu amor por Maria o retinha, a inexplicada gravidez o encucava. Não duvidava da sinceridade de Maria, mas não podia aceitar um filho que não era seu. Após muito refletir, revolvera abandonar a sua amada, atitude que marcaria Maria como uma mulher estigmatizada e jogaria a culpa sobre ele, tornando-o, aos olhos do povo, um desertor, um crápula incapaz de arcar com a responsabilidade. Já estava decidido quando um anjo lhe apareceu num sonho e esclareceu a situação. O anjo fez mais ainda, deu instruções precisas sobre a sua missão: “Ela dará à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus”.

Os fatalistas quererão minimizar a importância de José dizendo que ele foi obrigado a fazer isto, como Maria foi obrigada a ser Mãe de Deus, como nós somos obrigados a fazer o que fazemos, não temos escapatória, nem poder de decisão, nem possibilidade de fazer o bem nem o mal, as coisas simplesmente acontecem, somos condicionados pelas circunstâncias, não existe liberdade, só o determinismo cego.

Nosso Senhor Jesus Cristo, porém, define as coisas de outra maneira. No julgamento final, seremos separados à sua direita e esquerda, condenados ou conduzidos à glória, segundo as decisões que tenhamos tomado. “Tive fome, e Me destes de comer, …” E perguntaremos “Senhor, quando isto aconteceu?”

“Tudo o que fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequeninos, foi a Mim que o fizestes.”

Somos nós quem decidimos entre fazer o bem ou permanecer indiferentes à desgraça alheia – a indiferença, a grande inimiga do amor, exatamente o oposto da caridade, a frieza do coração, muito pior do que o ódio mais impenitente. O bem que deixamos de fazer só será conhecido no fim dos tempos, e nos envergonhará muito mais do que o mal que porventura tivermos feito, porque nem para isto – para fazer o mal – temos força.

José podia ter dito não, como nós muitas vezes dizemos. Mas, sendo justo, acordou do angélico sonho e fez como lhe ordenara o anjo.

*

– Tire-o! Tire-o! Tire-o, tolo! Tire O Anel!

E Frodo, tomando consciência de quem era, lembrou que era livre, era o dono do seu destino, e que tinha, ainda, um último instante para exercer a sua liberdade. Tirou O Anel. Uma sombra negra passou por ele, tateando na direção do oeste. Tomado de grande cansaço, mas com disposição firme, falou em voz alta:

– Agora, farei o que devo fazer.

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Patrocínios

A Nissan rescindiu o contrato de patrocínio com o Vasco da Gama alegando incompatibilidade de valores entre a montadora e o time de futebol devido à briga de torcidas ocorrida na semana passada.

Muito bem, parabéns à Nissan, é assim que se faz.

Fica a dica para nós, brasileiros inconformados com o dinheirão que muitas empresas dão às mais nefastas iniciativas culturais. Vamos escrever para elas dizendo exatamente isto, que estão associando a imagem com os piores valores existentes para a sociedade, da qual vivem – um verdadeiro tiro no pé.

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Lições de Abismo

Hoje Gustavo Corção faria aniversário. Nasceu em 1896, no Rio de Janeiro, e lá morreu em 6 de julho de 1978. Engenheiro, foi ele quem acendeu a iluminação do Cristo Redentor quando o sinal enviado por Marconi falhou. Publicou o seu primeiro livro, A Descoberta do Outro, aos 48 anos de idade – por coincidência, a mesma idade em que Olavo de Carvalho publicou O Imbecil Coletivo. Dentre os seus livros mais conhecidos estão Dois Amores Duas Cidades, O Século do Nada e o romance Lições de Abismo.

O que mais impressiona na obra de Corção não é a solidez de pensamento, nem o lirismo, nem a busca pela verdade. É o fato de que foi relegado ao esquecimento pela intelligentsia nacional e a importância do seu pensamento só se iguala ao esforço feito por seus inimigos para enterrá-lo. Os seus livros tornam-se cada vez mais raros.

Lições de Abismo foi traduzido para o inglês, alemão, italiano, holandês e polonês. Um homem com uma doença incurável e pouco prazo faz reflexões sobre a vida. Rememora o romance de Júlio Verne, Viagem ao Centro da Terra, no qual o líder da equipe obriga um dos membros da expedição a subir à torre de uma igreja em Hamburgo para perder o medo de altura. A este exercício, o chefe dá o nome de “lições de abismo”.

“Eu também vou fazer uma viagem ao centro da terra, embora menos interessante que a do sábio hamburguês. Minha penetração na crosta do planeta se deterá a dois menos de fundo, nessa superficialíssima camada sem nenhum interesse geológico ou paleontológico.”

“E a mim, quem me dará lições de abismo?”

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